Susana Viseu: “Quando há pobreza, não há sustentabilidade nem há quem olhe para as questões climáticas”
Começou o seu percurso profissional na área dos negócios, trabalhou no setor empresarial e como consultora mas, hoje, Susana Viseu tem como missão de vida o combate às alterações climáticas, com foco nas dimensões de género. Presidente da BUSINESS as NATURE - uma associação sem fins lucrativos - criada em 2019, a especialista conta-nos em detalhe em que consiste este projeto, as mudanças que já têm vindo a ser alcançadas e as ações que ainda podem ser tomadas para que possamos minimizar os danos causados pelas alterações climáticas.
A crise climática é um problema que toca a todas as comunidades, sublinha Susana. Não obstante, nos últimos anos, tem vindo a notar-se que algumas pessoas, nomeadamente as mulheres e as meninas, estão mais vulneráveis às consequências desta crise: “Ao longo da minha carreira comecei a entrar mais nestes temas do clima e percebi que há um reconhecimento das próprias Nações Unidas de que as mulheres e as meninas estão entre os grupos mais vulneráveis afetados pelas crises em geral e, em particular, pela crise climática. As mulheres têm de facto este papel, a nível global, de assistência à família, de assegurar o acesso à água e alimentação, e, porque muitas vezes não têm forma de subsistência, sempre que existem crises ao nível da afetação do emprego, as mulheres são primeiramente afetadas face aos homens. Para além disto, como não têm acesso à tomada de decisão, as decisões acabam por não ser tão representativas daquilo que são as suas necessidades”, explica a entrevistada do Podcast Gender Calling.
Apesar de as mulheres estarem mais vulneráveis a estas questões, também são elas que apresentam maior potencial de resolução do problema, segundo a visão da ativista: “Quando há situações sociais que afetam a população em geral, as mulheres não só são as mais afetadas, como são as primeiras a arranjar soluções. Eu acho que isto tem muito a ver com aquilo que é a nossa natureza. Muitas vezes, tentamo-nos afastar da biologia, (...), mas na maioria das espécies é assim: são as fêmeas das espécies que arranjam soluções e nós não somos diferentes”, defende.
Neste sentido, a BUSINESS as NATURE tem um projeto intitulado de "Women 4OUR WATER" que se foca especificamente em chamar a atenção de mulheres da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) para se mobilizarem e serem agentes ativas na resolução dos problemas climáticos: “Nós lançámos o Movimento das Mulheres Pelo Clima dos países de língua portuguesa para o mundo em setembro do ano passado. Este é o nosso projeto chapéu que acaba por agregar muitas das nossas iniciativas. Foi lançado na sede da CPLP com a presença de várias embaixadoras acreditadas em Portugal, onde definimos este manifesto que tem 6 linhas de atuação e que procura agir e liderar pelo exemplo na ação climática.”
As linhas de ação deste projeto passam, essencialmente, por dois níveis: o político e o local -- “São vários os exemplos que nós temos. Temos uma série de ligações a várias mulheres que no fundo são empresárias, mas que também são ativistas e mobilizadoras das suas comunidades, fazem também educação ambiental e acabam por juntar uma série de valências, que eu acho que é um bocadinho característico de nós mulheres, esta capacidade de fazermos várias coisas ao mesmo tempo”, diz-nos a ativista.
Ainda que as mulheres tenham este papel importante enquanto catalisadoras da mudança, Susana alerta-nos para a importância de uma ação climática global em que todos os países e todas as pessoas se unem para tentar minimizar os efeitos que já são notados: “Os últimos relatórios demonstram que de facto o processo está a acelerar de uma forma que não estava inicialmente prevista. (...) No entanto, ainda não estamos num ponto de não retorno. Ainda é possível minimizar estes efeitos se se conseguir acelerar a ação climática global (...), mas temos de pensar que não basta nós na Europa fazermos um determinado caminho quando há outros países como, por exemplo, o Brasil ou a China, que querem também atingir os patamares de desenvolvimento que nós conseguimos na Europa e nos EUA. E eles têm direito a esse desenvolvimento. Quando há pobreza, não há sustentabilidade, não há quem olhe para as questões climáticas. Este é o grande desafio: como é que permitimos que estes países façam o seu desenvolvimento, saltando passos e conseguindo fazê-lo de uma forma mais sustentável. E isso só se consegue através do financiamento dos países mais desenvolvidos aos menos desenvolvidos e da transferência de tecnologia e de conhecimento”, argumenta Susana.
Numa conversa de extrema urgência, Susana Viseu partilha como é que se pode convencer os vários públicos a aderir à causa, qual a situação atual do planeta Terra em relação à crise climática e como é que, todos juntos, podemos lutar por um futuro promissor.
Entrevista disponível no Podcast Gender Calling (em todas as plataformas).