Furar as orelhas a um bebé é uma agressão?
O debate já tem vários anos. No Reino Unido, chegou mesmo a ser criada uma petição há 7 anos que continua ativa, e conta já com mais de 88 mil assinaturas. Susan Ingram, a mãe que lançou o apelo, argumenta que furar as orelhas aos bebés é "uma forma de crueldade infantil" e que o ato "serve apenas o propósito de satisfazer a vaidade dos pais". Vai ainda mais longe e diz que, se há "outras formas de magoar fisicamente as crianças que são ilegais, esta não deve ser diferente".
A Sociedade Americana de Pediatria recomenda às famílias que adiem o ato de furar as orelhas até que a criança seja "madura o suficiente para tomar conta da zona perfurada", ou seja, fazer a respetiva limpeza. Mas, se os cuidadores quiserem avançar desde cedo, a mesma organização defende que se deve aguardar pelo menos até depois de a criança levar a primeira vacina contra o tétano, de forma a reduzir o risco de infeções.
A médica Carolina Gouveia, especialista em Dermatologia Pediátrica, defende que "até aos 3 meses não se devia furar. Também se recomenda que o sistema imunitário esteja maduro e, portanto, que tenha as vacinas do tétano e da Hepatite B antes de furar as orelhas". A pediatra alerta para os riscos de fazer o procedimento numa idade muito tenra: "As crianças pequenas levam as mãos às orelhas e isso pode levar a uma infeção ou podem até engolir o brinco, o que pode provocar asfixia", explica.
E a dor? E o consentimento?
No grupo de famílias que está contra a prática, fala-se em "crueldade", "violência" e até "mutilação". Ana Sanches, mãe de Rodrigo (x anos) e Laura (x anos) não vai tão longe, mas traz a importância do consentimento para cima da mesa: "Se não pensamos na hipótese de fazermos tatuagem aos nossos filhos, porque é que decidimos furar as orelhas às nossas filhas? Não me faz sentido ser eu a decidir por ela", afirma.
Entre Ana e o marido a questão nem chegou a ser discutida porque ambos partilham da mesma opinião. Laura não tem as orelhas furadas. "É algo totalmente estético, não é fisiológico. Acho que devemos ter respeito pelo corpo das crianças, tal como também não gostamos que mexam no nosso corpo sem nós querermos", exemplifica.
E é possível um bebé ficar com o trauma da dor daquele momento? "As ferramentas que temos para avaliar se um bebé se vai lembrar da dor são limitadas. O que se sabe é que a partir dos 6 meses uma criança tem perceção da dor e o momento pode consistir num trauma no sistema de memória do bebé, sim. É possível", admite.
Ana Sanches, autora da página de Instagram Dido and Company, tem as orelhas furadas mas só desde os 7 anos: "Fui eu que pedi. A minha mãe conta-me que as minhas amigas tinham e eu quis ter também". Quer seguir esse exemplo, e compara o ato a outras escolhas que se faz para os filhos: "Não me faz sentido escolher por ela, tal como não me faz sentido batizar porque acho que ela é que deve escolher se quer seguir alguma religião. Eu vou dar primazia aos gostos dela e à vontade dela", justifica.
Se se optar por furar, é importante seguir estes conselhos:
- O ato tem de ser feito em condições assépticas de desinfecção de toda a zona, com material esterilizado
- Nos primeiros dias deve ser utilizado desinfetante 2 a 3 vezes por dia
- O brinco deve ser de ouro ou de aço inoxidável, pois são os que têm menos probabilidade de provocar alergias
- O brinco deve ser rodado todos os dias, nos primeiros tempos